SOBERANIA DIGITAL: O QUE O BRASIL PRECISA FAZER PARA PROTEGER SEUS PRÓPRIOS DADOS?

17 de junho de 2025

A relação entre soberania digital e política de dados no Brasil tem se tornado cada vez mais complexa. A ausência de uma estratégia tecnológica articulada a um projeto de desenvolvimento econômico tem deixado o país em posição de dependência no que se refere ao controle e uso dos dados gerados internamente.

Nos últimos anos, a governança internacional da tecnologia passou a ser um campo de disputa entre grandes potências. Os Estados Unidos e a China consolidaram-se como polos dominantes, enquanto a União Europeia, diante da ausência de gigantes tecnológicos próprios, optou por exercer influência por meio da regulação. A legislação europeia sobre proteção de dados, por exemplo, influenciou diretamente normas adotadas em outras regiões, inclusive no Brasil.

Esse movimento global colocou em xeque o papel tradicional dos Estados como principais agentes reguladores. À medida que as corporações transnacionais ampliaram seu poder sobre fluxos de dados e infraestrutura digital, os Estados passaram a dividir espaço com empresas que operam, muitas vezes, com maior influência que governos nacionais. Essas companhias, apesar de privadas, se envolvem diretamente em questões públicas, operando como verdadeiros centros de poder global.

O Brasil, nesse contexto, ainda apresenta deficiências na construção de uma política nacional de dados. Há carência de incentivos para o desenvolvimento de infraestrutura local, como centros de dados e serviços de nuvem operados internamente. Apesar de existirem empresas nacionais com capacidade para atuar nesse setor, as políticas públicas têm favorecido a entrada de capital e tecnologia estrangeiros sem assegurar mecanismos de controle nacional.

Enquanto outras nações buscam preservar sua autonomia digital por meio de investimentos públicos e desenvolvimento tecnológico interno, a estratégia brasileira recente tem se orientado pela facilitação de investimentos externos, inclusive com propostas que priorizam atores já consolidados globalmente. Isso pode ampliar a dependência tecnológica do país e reduzir sua capacidade de autogerir os dados que circulam em seu território.

Além da infraestrutura física, existe um componente jurídico relevante: muitas das empresas que prestam serviços de armazenamento e processamento de dados no Brasil estão sujeitas a leis internacionais que permitem que governos estrangeiros solicitem acesso às informações armazenadas, mesmo que fora de seu território. Isso compromete a efetividade de legislações nacionais voltadas à proteção de dados.

Para que o país avance em direção a uma autonomia digital efetiva, seria necessário estruturar uma política pública integrada que promovesse o fortalecimento de soluções nacionais, o uso de software livre, a proteção da jurisdição sobre dados sensíveis e o investimento em infraestrutura própria. A conectividade existente, com redes de fibra óptica e tecnologia 5G já em funcionamento, oferece uma base sólida. Falta, no entanto, uma articulação estratégica que una esses recursos a um projeto nacional de soberania digital.

Diante das escolhas que vêm sendo feitas, cabe refletir sobre o papel do Brasil nesse novo mapa de poder tecnológico global. Persistir como mero consumidor de soluções externas ou como fornecedor de matéria-prima digital representa um risco à autonomia. Ao contrário, promover o desenvolvimento de uma economia digital robusta e inclusiva, com estímulo à inovação local e preservação dos interesses públicos, pode colocar o país em rota de maior protagonismo e independência.