O tratamento de dados biométricos — que envolve impressões digitais, reconhecimento facial e de íris, geometrias corporais, padrões de voz e até traços comportamentais como a forma de digitar ou caminhar — está no centro do debate regulatório brasileiro. A discussão é indispensável para apoiar futuras normas da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), especialmente diante da digitalização acelerada e do avanço de práticas de fraude cada vez mais sofisticadas.
Um dos pontos sensíveis está na autenticação segura. Com o vazamento massivo de dados cadastrais e a utilização de inteligência artificial por grupos criminosos, a possibilidade de simulação de identidade tornou-se mais concreta. Surge, então, a questão: como assegurar que a pessoa, no ambiente digital, é de fato quem afirma ser?
Funções da biometria no ecossistema digital
A biometria já desempenha papel central em diferentes áreas:
- Autenticação em serviços digitais;
- Controle de acesso físico e lógico em empresas e sistemas críticos;
- Prevenção e detecção de fraudes, principalmente em abertura de contas, concessão de crédito, validação de identidade e transações eletrônicas.
Ainda assim, não se trata de uma solução isenta de riscos. Enquanto senhas podem ser alteradas, dados como rosto, íris e impressões digitais não podem ser substituídos. Isso amplia a responsabilidade das organizações que utilizam tais recursos.
Pontos que devem orientar a futura regulação
A atuação normativa da ANPD deverá enfrentar questões relevantes, entre elas:
- Segurança e prevenção a fraudes: reforçar a proteção sem criar vulnerabilidades adicionais ou discriminações sistêmicas.
- Biometria comportamental e tradicional: delimitar critérios distintos entre dados físicos (digital, íris, face) e dados de comportamento (voz, digitação, postura).
- Hipóteses legais de tratamento: analisar contextos em que o consentimento não seja adequado como base jurídica.
- LGPD e prevenção à fraude: estabelecer parâmetros claros para a aplicação do art. 11, II, “g”.
- Reconhecimento facial: projetar mecanismos confiáveis, reduzindo falsos positivos e negativos.
- Riscos de violação: definir requisitos técnicos e organizacionais obrigatórios para mitigar vazamentos e fraudes de identidade.
- Negativa do titular: determinar em que situações a recusa em fornecer biometria pode resultar em limitações proporcionais e transparentes.
Biometria e setores regulados
Alguns segmentos já exigem identificação biométrica, como o de apostas. A Lei Geral de Proteção de Dados reconhece tais dados como sensíveis, mas admite seu uso para prevenção à fraude e proteção dos próprios titulares.
Diante disso, a biometria pode ser aliada da segurança digital, desde que empregada com rigor técnico, transparência e respeito aos direitos fundamentais. Cabe às empresas adotar práticas sólidas de governança e proteção da informação, não apenas para resguardar as pessoas, mas também para reduzir seus riscos jurídicos.