A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) completa cinco anos em vigor, mas sua efetiva implementação ainda caminha de forma desigual no Brasil, sobretudo no contexto municipal. Apesar de avanços institucionais e do aumento expressivo de decisões judiciais que citam a legislação — mais de 15 mil apenas na edição mais recente do painel nacional que acompanha o tema — a realidade prática indica que muitas empresas e órgãos públicos ainda operam em níveis variados de maturidade.
Uma das principais barreiras para a consolidação da cultura de proteção de dados é a percepção de que as sanções administrativas ainda não são plenamente aplicadas, o que gera a falsa sensação de que o cumprimento da norma pode ser postergado sem consequências imediatas. Entretanto, o aumento da judicialização e da exigência contratual por conformidade com a LGPD vêm sinalizando mudanças importantes.
Empresas de menor porte, especialmente em cidades de médio e pequeno porte, enfrentam dificuldades maiores. Muitas ainda não conseguem atender de forma plena às exigências, seja por desconhecimento técnico, seja por limitações orçamentárias. Ainda assim, a adaptação avança, sobretudo em setores mais regulados, como saúde, educação e financeiro.
No setor privado, práticas como coleta de dados sem informação clara sobre a finalidade, ausência de consentimento para envio de comunicações, e exposição indevida de informações sensíveis continuam ocorrendo. Tais práticas, além de representar risco jurídico e financeiro, impactam diretamente na reputação institucional e na confiança de clientes e colaboradores.
No setor público, as exigências legais impõem a implementação de medidas efetivas de segurança e governança. A coleta e tratamento de dados sensíveis pela administração municipal ou por órgãos vinculados requer não apenas adequações técnicas, mas também revisão de procedimentos, capacitação de servidores e controle dos fluxos internos.
Entre os riscos associados ao descumprimento da LGPD estão: perda de contratos com empresas que exigem conformidade, judicialização por parte de titulares de dados e sanções administrativas aplicadas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). Mais do que isso, há um impacto direto sobre a credibilidade da organização.
Boas práticas recomendadas incluem a revisão de contratos, registro e mapeamento dos fluxos de dados, uso de ambientes seguros, descarte adequado de documentos, anonimização de dados sempre que possível e limitação de acesso conforme o perfil do usuário. Além disso, é essencial que qualquer coleta de dados seja acompanhada de transparência e fundamentação legal.
Duas experiências relatadas ilustram caminhos distintos nesse processo. Uma empresa do setor de tecnologia, atuante no desenvolvimento de softwares de gestão, reforçou seu sistema de proteção de dados com treinamentos periódicos, limitação da coleta de informações e revisão de sistemas. O fortalecimento da cultura de segurança foi um dos pilares dessa transformação.
Por outro lado, um hospital de médio porte enfrentou desafios adicionais. Apesar dos avanços na organização de dados, nas rotinas de recepção e nas práticas de identificação de pacientes, a permanência de processos baseados em papel ainda é um obstáculo. A ausência de sistema de assinatura eletrônica validado e a obrigatoriedade legal de guarda de prontuários por mais de duas décadas exigem investimentos que ainda não foram implementados.
Mesmo com dados digitalizados, a falta de validação eletrônica impõe a impressão de documentos, prolongando a dependência do papel. O hospital, entretanto, já planeja a adoção de soluções tecnológicas até 2026, priorizando a digitalização segura e a conformidade com a LGPD.
A consolidação da proteção de dados como prática institucional passa, portanto, por uma mudança de cultura, não apenas por ajustes pontuais. Proteger informações pessoais exige mais do que adequações técnicas — demanda comprometimento, responsabilidade e compreensão da importância desse direito no ambiente organizacional.